Sade e a literatura brasileira

Roberto Piva, o mago do surrealismo no Brasil, tornou-se ao longo de sua trajetória uma importante figura da poesia brasileira. São Paulo, 1937, ano em que nascia este poeta paulista, que traria em toda a sua obra, esta cidade como pano de fundo. Formado em sociologia, atuou como professor de estudos sociais e história por algum tempo, onde se mostrou um grande educador em potencial. 

Durante a década de 1960, freqüentou o ‘Instituto Italiano di Cultura’, onde se dedicou no estudo da obra de Dante Alighieri, aprofundando-se na Divina Comédia. Este foi um autor que o influenciou bastante, e deixou sua marca em sua vida. Além deste, muitas foram as influências em sua poética. Vão desde poetas metafísicos como William Blake, do filósofo Friedrich Nietzsche, dos poetas visionários como Rimbaud e Lautréamont, até os poetas do surrealismo da vertente francesa de André Breton, Antonin Artaud e René Crevel. Jorge de Lima, grande poeta brasileiro, também serviu de inspiração para Piva. 

Piva iniciou a sua atuação no meio literário no ano de 1961, com a publicação de seus primeiros poemas, e atuou até 2010, ano de seu falecimento. 

Piva foi um autor místico da geração surrealista, onde vivenciou e produziu poesias experimentais. Segundo Alcir Pécora, organizador dos volumes das obras completas publicadas pela Editora Globo, podemos dividir a obra de Piva em seus “surtos” poéticos, ou blocos. Onde no primeiro volume podemos ver Piva sob um viés da geração beat, num segundo volume vê se sob um viés com traços psicodélicos e experimentais, e no último bloco vê se Piva num surto místico e visionário. Além de sua poesia ter uma forte presença de um erotismo violento e do homoerotismo. 



"Pornosamba para o Marquês de Sade" 


Esta homenagem coincide com a deterioração da 
Bastilha Sul-Americana minada pela crise de corações 
& balangandãs econômicos onde se mata de tédio o 
poeta & de fome o camponês & sobre os pés femininos 
se calça a bota de chumbo de várias cores gamadas 
com Hitlers de plantão em cada esquina recoberta de 
saúvas & amores escancarados como túmulos onde tuas 
coxas Marquês, servem de amparo delicado para o 
garoto que chupa teu pau enquanto uma mulher ruiva 
te cavalga Assim, anotemos o nome da 
vítima-orgasmos-blasfêmia antes que as araras entrem 
na orgia com seus estimulantes bicos recurvos & um 
estratagema de cipós afague os sóis da desolação 
quotidiana em nível de Paraíso A noite é nossa Cidadão 
Marquês, com esporas de gelatina e pastéis de esperma 
& vinhos raros onde saberemos localizar o tremor a 
sarabanda de cometas o suspiro da carne. 


Poema de Roberto Piva, presente em seu livro Coxas (1979) 




"Homenagem ao Marquês de Sade" 


O Marquês de Sade vai serpenteando menstruado por 
máquinas & outras vísceras 
imperador sobre-humano pedalando a Ursa maior no 
tórax do Oceano 
onde o crocodilo vira o pescoço & acorda a flor louca 
cruzando a mente num suspiro 
é aéreo o intestino acústico onde ele deita com o vasto 
peixe da tristeza violentando os muros de sacarina 
ele se ajoelha na laje cor do Tempo com o grito das 
Minervas em seus olhos 
o grande cu de fogo de artifício incha este espelho de 
adolescentes com uma duna em cada mão 
as feridas vegetais libertam os rochedos de carne 
empilhadas na Catástrofe 
um menino que passava comprimiu o dorso descabelado 
da mãe uivando na janela 
a fragata engraxada nos caminhos da sobrancelha 
calcina 
o chicote de ar do Marquês de Sade 
no queixo das chaminés 
falta ao mundo uma partitura ardente como o hímen 
dos pesadelos 
os edifícios crescem para que eu possa praticar amor 
nos pavimentos 
o Marquês de Sade pôs fogo nos ossos dos pianistas que 
rachavam como batatas 
ele avançava com tesouras afiadas tomando as nuvens de 
assalto 
ele sopra um planador na direção de um corvo agonizante 
ele dilacera & me protege contra o surdo século de 
quedas abstratas


Poema de Roberto Piva, presente em seu livro Piazzas (1964)





Voz de Roberto Piva,faixa 5, áudio do CD "Nama coracibus tutela Mercurii", que acompanha o livro Estranhos sinais de Saturno, volume 3. 




"Sua Excelência o Marquês de Sade" 


fora da tribo 

um anjo de outrora 

bugigangas 

as águias me atravessam 

por todos os lados 

os brasões são TOTENS 

contra Eguns 

você dança o samba de 

EROS 

cavalgando o cometa 

da POESIA 


Poema de Roberto Piva, presente em seu livro Coxas (1979).


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